segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Deficientes visuais reivindicam direitos para exercer cidadania plena

Márcia Viera, Jornal do Brasil
RIO - O tradicional Garota da Urca reúne sempre um grupo de frequentadores muito especiais. Os amigos, Luis Claudio Freitas, 30 anos, Cinthya Pereira, 34, e Márcio Aguiar, mesma idade, quando podem batem ponto por lá. O motivo é simples: além do bom atendimento, o restaurante é um dos poucos na cidade que oferece cardápio em linguagem braile, apesar de ser uma lei municipal. Sem ele, os deficientes visuais precisam ter paciência de Jó para serem atendidos em qualquer estabelecimento. Os garçons, em sua maioria, evitam em atendê-los por puro preconceito. Um comportamento que inibe muitos na hora de exercerem a sua cidadania.
– Muitas vezes, temos que contar com a boa vontade do garçom e ter muita paciência– reclama a professora de inglês Cinthya Pereira, que perdeu a visão aos 25 anos por diabetes, e que aprendeu alguns macetes para ser atendida. – Eu pergunto se ele vai ser o responsável pelo atendimento da nossa mesa e digo que não temos como vê-lo. Normalmente funciona.
Mas nem sempre a noite termina com um final feliz. A falta de treinamento dos garçons faz com que muita gente fique em casa.
– O radinho de pilha ainda é o maior companheiro do cego – ressalta o técnico judiciário Márcio Aguiar, que só enxerga vultos. – Para mudar isso, é preciso quebrar as barreiras que nos impedem de levar uma vida normal.
Família pode ser vilã
Mas muitas vezes a maior barreira começa em casa.
– A família atrapalha, esconde o deficiente visual– ressalta o presidente em exercício da Adverj (Associação dos Deficientes Visuais do Rio de Janeiro), Luis Claudio, que vê pouco e com um olho apenas.
Opinião que é compartilha por Cinthya:
– Eles acham que nos protegem, mas no fundo nos aniquilam.
A superproteção da família, segundo Márcio Aguiar, se deve ao medo de que a limitação possa machucar o deficiente quando ele sai de casa.
– É preciso tocar o coração das pessoas. Nós temos o direito de ir e vir, de ter acesso à informação, de trabalhar, de nos alfabetizar. Mas par isso precisamos sair de casa – desabafa Márcio.
Mas a vida dessas pessoas seria menos árida se a legislação fosse cumprida à risca. A construção de uma pequena rampa pode evitar um tombo certo. A solidariedade pode ajudar um deficiente visual a atravessar a rua na hora do rush ou num dia de chuva. Exemplos de gentileza urbana e não de piedade ou compaixão.
– O carioca é legal, ajuda bastante, mas com pena – ressalta Márcio.
E pena é justamente o que 25 milhões de brasileiros, que sofrem de algum tipo de deficiência, não querem.
O dia-a-dia mostra, por exemplo, que essas pessoas estão muito longe da fragilidade que se imagina. Eles convivem, desde cedo, com um mundo cercado de escuridão e de obstáculos invisíveis. Mas nem por isso deixam de ir ao supermercado, comprar roupas no shopping ou trabalhar.
– O ato de sair de casa todos os dias, com toda a insegurança que nos cerca, com todos os preconceitos e perigos, é um ato político, heróico – ressalta Márcio.
E o principal agente transformador de todo esse processo é o próprio deficiente.
– Buscamos o respeito à diversidade, mas a principal postura tem que partir da gente. Temos o poder se modificar esse processo, mas para isso não podemos abrir mão da nossa cidadania – analisa Luis Claudio.
19:23 - 15/08/2009

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